O autor do livro - Bhagavad Gītā, uma nova tradução e guia de estudo, o professor Nicholas Sutton, é diretor do centro de estudos hindus da universidade de Oxford. Tem como principais funções o desenvolvimento de cursos, o ensino e a publicação de obras.
A sua tese de doutoramento foi sobre os ensinamentos religiosos do Mahābhārata.
Tem realizado inúmeros artigos sobre a tradição hindu para jornais académicos bem como capítulos em diversos livros.
Este trabalho fez com que se aproximasse das comunidades hindus do norte de Inglaterra onde tem vindo a desenvolver cursos para estudar as escrituras hindu bem como as práticas religiosas dessa tradição.
Na sua obra, Bhagavad Gītā – uma nova tradução e guia de estudo, o autor analisa detalhadamente as ideias de Bhagavad Gītā e apresenta também o seu contexto.
No prefácio e na introdução, explica que o texto, é composto por 18 capítulos e 700 versos. Aparece como uma seção do Bhīṣhma-Parvan, o sexto livro do Mahābhārata, situado pouco antes da batalha de 18 dias em Kurukshetra.
Neste conflito, as esperanças da fação Pandava focam-se em grande parte sobre as proezas marciais de Arjuna, o terceiro dos cinco irmãos Pandava.
Mas, Arjuna, mostra-se hesitante em travar uma guerra contra os seus próprios membros da família. É neste momento que Krishna, seu primo, começa a oferecer indicações a Arjuna. No momento inicial a intenção do discurso de Krishna é só convencer Arjuna de que travar uma guerra não é necessariamente um ato de maldade.
Só que esse diálogo vai muito mais para além disso, e transforma-se numa exposição completa de crenças e práticas que tiveram uma imensa influência na formação de doutrinas religiosas hindus.
Analisando os capítulos do livro, percebe-se que o capítulo 1 é sobre a lamentação de Arjuna, o que origina a que Krishna comece com os seus ensinamentos. Passando para o capítulo 2 verifica-se que existe uma alteração das respostas iniciais de Krishna à recusa de Arjuna em lutar e, em particular, a maneira como ele valoriza a natureza eterna do ser vivo. Deste modo, o leitor começa a ter contacto com a noção de karma yoga, que Krishna oferece como uma resposta direta ao medo de Arjuna de ação pecaminosa. Essa noção é extremamente importante no pensamento religioso hindu, pois demonstra como uma pessoa pode simultaneamente cumprir as suas obrigações sociais e ao mesmo tempo trabalhar para alcançar os mais altos objetivos espirituais. No capítulo 3, pode-se observar mais pormenorizadamente a explicação de Krishna sobre o karma yoga e, em seguida, observar a evolução destes ensinamentos, nos capítulos 4 e 5 culminando na explicação de dhyāna, que é apresentada no capítulo 6. Aqui, segundo o autor, é encontrado outro tipo de espiritualidade defendida pelo Bhagavad- Gītā. Está a referir-se ao processo de yoga meditacional pelo qual se adquire perceção direta do eu interior, o atman.
Assim, chegando a este ponto da leitura, constata-se que os seis capítulos iniciais são sobre a explicação de como alguém poderá seguir o caminho da renúncia enquanto cumpre obrigações sociais, mas a partir do início do capítulo 7 encontra-se agora uma mudança no discurso, passa a ser mais focado na natureza de Deus e no poder da graça divina. Entre os capítulos 7 a 12, Krishna não só ensina Arjuna sobre a natureza da Divindade Suprema, mas também revela que ele próprio é aquela Divindade. E em resposta à oração de Arjuna, ele também manifesta sua identidade divina como aquele que é tudo. Após esta grande revelação no capítulo 11 e a ênfase colocada na devoção a Deus, os capítulos 13 a 16 diversificam os ensinamentos e abrangem uma variedade de temas que servem para reforçar os anteriores. Um tema comum que percorre esses capítulos posteriores é o foco nas ideias de Sāṃkhya, o sistema filosófico que procura definir a manifestação material e estabelecer a identidade distinta da alma individual em todos os seres. Nos dois capítulos finais 17 e 18, encontra-se novamente uma variedade de ideias, incluindo uma exploração da forma como os gunas: sattva, rajas e tamas, as três qualidades inerentes da matéria, podem ser identificadas dentro deste mundo.
O Bhagavad- Gītā termina com uma revisão dos ensinamentos retendo as principais ideias que apresentou anteriormente, dando importância ao aspeto da devoção.
Analisando agora mais a estrutura do livro de Nicholas Sutton, consta-se que, segundo o próprio autor, não existe uma interpretação individual de cada verso, mas sim uma abordagem mais geral, mais relacionada com os temas, o discurso e as principais ideias de cada capítulo tentando identificar o significado mais profundo deste texto.
Nalgumas partes dá atenção a alguns termos em sânscrito e utiliza também informação de comentários sobre o Bhagavad Gītā, principalmente de Shankaracharya, Ramanujacharya e Madhvacharya.
Tenta fazer uma reflexão sobre os ensinamentos do texto à luz do mundo contemporâneo e como podem ter relevância para o mundo moderno.
Começa por considerar a posição do texto dentro do Mahābhārata e a sua importância dentro da tradição hindu antes de considerar algumas das visões dos estudiosos contemporâneos.
Sabendo que o Bhagavad Gītā é amplamente conhecido e estudado, tanto no ocidente como na India, e como tal, existem inúmeras traduções em inglês, que segundo o autor
analisam mais o conteúdo e propõem várias teses acerca das fontes, datas e estrutura, o autor recomenda algumas traduções académicas que segundo a sua opinião, são bastante acessíveis.
Este é um aspeto positivo a destacar deste livro, pois quem quiser aprofundar o estudo, seguindo a linha do autor poderá fazê-lo com a leitura destes livros.
As suas recomendações são para livros que analisam o significado dos ensinamentos de Krishna e exclui textos que fazem críticas à estrutura do Bhagavad Gītā.
Os livros recomendados são os seguintes:
Edgerton, F. (1997) The Bhagavad-. Gītā Cambridge, Massachusetts, Harvard University Press
Johnson, W. (2004) The Bhagavad- Gītā. Oxford, Oxford University Press
Parrinder, G. (1974) The Bhagavad- Gītā, a Verse Translation. London, Sheldon Press
Zaehner, R. (1973) The Bhagavad- Gītā. Oxford, Oxford University Press
Versão de Juan Mascaro, publicada por Penguin Classics
Outro aspeto positivo na leitura deste livro é o facto de haver uma explicação de alguns conceitos chave que vão aparecendo ao longo do texto e das ideias principais que são focadas.
O autor faz mesmo a ligação dos diferentes conceitos e das ideias principais com passagens em determinados capítulos. Assim a leitura e interpretação do texto torna-se mais acessível para o leitor. Mesmo para aquele leitor que não domina muito bem os conceitos e que não está muito familiarizado com o texto.
Sobre a questão da data da criação de Bhagavad Gītā, o autor salienta um aspeto bastante comum aos textos sânscritos oriundos da índia, que é a dificuldade de uma datação específica que tenha o acordo de todos os estudiosos e académicos deste assunto.
Um aspeto menos positivo encontrado no livro é haver algumas passagens que falam de Mahābhārata e da ligação com o Bhagavad Gītā, mas não existe uma explicação mesmo que muito breve e simples sobre o que é Mahābhārata. Algum leitor que só tenha ouvido falar de Bhagavad Gītā e que leia o livro só por mera curiosidade literária pode-se “perder” um pouco, pois provavelmente não terá muitos conhecimentos para entender todo o contexto.
Fica assim a ideia que é um livro mais acessível para quem já tem alguns conhecimentos e noções sobre a história e religião da índia e que será um estudioso sobre o tema.
Nesse caso, a leitura do livro é bastante simplificada, pois para além da explicação de cada um dos capítulos, existe sempre um resumo de cada um desses mesmos capítulos.
Na parte final do livro o facto de existir uma descrição dos vários nomes de Krishna e Arjuna, bem como um glossário de termos e conceitos usados ao longo de toda a obra é mais um aspeto que facilita em muito a sua compreensão.
Concluindo, este é um livro de fácil leitura e interpretação para quem tem interesse nesta temática. Apresenta-se como um guia de estudo e de facto é, pois aborda o conteúdo do Bhagavad Gītā, explica conceitos necessários a um maior entendimento global e faz ligação desses conceitos com a própria explicação do diálogo entre Krishna e o seu primo Arjuna.
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